sábado, 5 de maio de 2007

O CASAMENTO PERFEITO

Cibele e Jânio recentemente completaram sete anos de casados. Ao contrário do que todos dizem, para eles não era uma fase de crise e sim de muita harmonia. Conquistaram muitos progressos desde que selaram o matrimônio e, hoje, viviam de forma estável. Problemas e brigas existiam, mas num contexto geral, podiam considerar-se um casal feliz. Desde a época de namoro haviam combinado que seria uma união deles e para eles, por isso não queriam ter filhos. Ela nunca se imaginou como mãe. Perdendo noites, as preocupações naturais da maternidade, a perda da privacidade e da liberdade. Definitivamente não era pra ela. Em Jânio encontrou o homem ideal. Carinhoso, bonito, promissor, aparentemente fiel e, o mais importante, não queria crianças.

Os dois estavam embutidos nos mesmos objetivos de estudos e crescimento profissional, além da dedicação mútua. Assim estavam vivendo, assim estavam felizes. Cibele fazia uso de contraceptivos regularmente e, embora tivesse uma vida sexual intensa, sem uso de preservativos, nunca suspeitara de uma gravidez. Acontece que o destino reservara uma surpresa. Fazia três semanas que sua menstruação não chegava. Ela começava a sentir enjôos e achava a barriga um tanto inchada. Tinha certeza que estava grávida. Como dar a notícia a Jânio? Ele certamente tomaria aquilo como uma traição ao pacto dos dois. Ela não planejara, certamente o anticoncepcional havia falhado, mas tinha medo da reação do marido. O pânico foi tanto que não teve condições de fazer o exame para atestar a gestação. Passaram-se duas semanas e nada. Cibele mudou, ficou distante, fria e Jânio percebeu. Ela usou uma série de desculpas e justificativas, mas Jânio notara claramente a alteração no comportamento da esposa. Começou a ficar com uma pulga atrás da orelha e a pressioná-la para que abrisse o jogo.

Foi tanta a pressão que Cibele não suportou. Acabou por contar a Jânio da sua suspeita. A reação dele foi a pior possível. Primeiro acusou-a de desleixo, irresponsabilidade, de tentar enganá-lo. Depois contestou a paternidade. Cibele não sabia, mas Jânio era estéril e, mesmo no calor daquele momento, não teve coragem de contar. Na verdade ele era um complexado, falava que não queria filhos por não ter coragem de assumir sua condição de infértil. E, por último, isto foi à gota d´água, logo sugeriu o aborto. Cibele tremeu nas bases. Não queria ser mãe, mas jamais cometeria um ato daqueles. Preferia abrir mão de todos os seus princípios, a carregar a culpa de tirar a vida de uma criança inocente, cuja existência não foi sua escolha e por quem se sentia com total responsabilidade. Jânio foi irredutível. Sabia que o filho não era dele embora não contestasse com a esposa a situação, para não expor o seu grande fracasso. Era incapaz de procriar. Aí nasceu a desconfiança, a decepção, a desarmonia, coisas que alguém jamais imaginaria existir entre os dois.

Os últimos dias foram um inferno. Mal se falavam e, quando isto acontecia, só trocavam acusações e ofensas. Cibele, já não agüentando a situação, buscou os conselhos da mãe. Esta, por sua vez, levou-a ao médico. Era o mais natural, tudo estava movido por meras suposições. Realizados os exames, veio o surpreendente diagnóstico. Ela não estava grávida. Uma pequena disfunção hormonal atrasou suas regras e a cabeça cuidou para o surgimento do resto dos sintomas. Um verdadeiro alívio. Não via à hora de contar ao marido que tudo não passara de um grande engano.

Assim as coisas se resolveram. Ficou, no entanto, uma grande seqüela, uma nova visão de um para o outro, na forma de enxergar o seu companheiro. Botadas as cartas na mesa, o casal prosseguiu com a vida de sempre. Mas o casamento perfeito jamais foi o mesmo depois da suposta gravidez de Cibele. Não foi à-toa que eles vieram a se separar um ano depois.

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