sábado, 24 de novembro de 2007

SUCO DE LIMA - Ou Melhor: Limada!

Seresta Sertaneza
(Elomar)

Nos raios de luz de um beijo puro
me estremeço e eis-me a navegar
por cerúleas regiões
onde ao avaro e ao impuro não é dado entrar
tresloucado cavaleiro andante a vasculhar
espaços de extintos céus
num confronto derradeiro
vencí prometeu, anjo do mal
o mais cruel
acusador de meus irmãos
nestes mundos dissipados
magas entidades dotam o corpo meu
de poderes encantados
mágicos sentidos
na razão dos céus
pois fundir o espaço e o tempo
vencer as tentações rasteiras
do instinto animal
só é dado a quem vê no amor
o único portal
através de infindas sendas
vias estelares um cordel de luz
trago atado ao umbigo ainda
pois não transmudei-me ao reino dos cristais
apois Deus acorrentou os sábios
na prisão escura das tres dimensões
e escravisados desde então
a serviço dos maus
vivem a mentir
vivem a enganar
a iludir os corações
visitante das estrelas
hóspede celeste visões ancestrais
me torturam pois ao tê-las
quebra o encanto e torno ao mundo de meus pais
À minha origem planetária
enfrentar a mansão da morte do pranto e da dor
donzela fecha esta janela
e não me tentes mais.

Hoje eu passei a maior parte do dia conversando com Lai. Conversar com Lai é um exercício de prazer. Um aprendizado. A mulher é foda. È muita inteligência para uma pessoa só. De conversar tanto com ela, acabei lembrando de um cara que tem uma importância imensa na minha vida, só que não sabe disso. O cara ajudou a ser quem eu sou, a formar o meu caráter. Dentre tantas coisas boas que ele me proporcionou, foi ele quem me apresentou a Elomar. Precisava vir um cara de Brasília para me mostrar o que o baiano tem. Não falo apresentar fisicamente, mas à canção, o que, no caso de Elomar, é muito mais importante.

Lembro quando, em 1984, eu morava no pensionato de D. Celina no Rio Vermelho dividindo um quarto com meu irmão Luciano. Não me lembro porque motivo Luciano foi embora. Eu tremia de medo. Quem viria ocupar aquela vaga? Com qual estranho eu teria de dividir o meu quarto? Um dia, na hora do almoço quando eu cheguei da escola, D. Celina me falou que tinha alugado a vaga do quarto para um cara de Brasília. Segundo ela, gente boa, coroa e bancário. Não conheci e não gostei! Parafraseando Guimarães Rosa( como alguém me disse um dia mas não posso confirmar esta afirmação). Preconceito é foda! Como eu podia não gostar de alguém que sequer conhecia? Só por julgar que ele estava invadindo o meu espaço? Ainda por cima com o nome de Lima. Fazia-me lembrar das limadas que minha mãe me dava quando eu tava doente. Só faltava vomitar. Lima entrou na minha vida como se fosse remédio, que você só toma porque não tem jeito. Não sabia eu ainda, teria de engolir tudo que pensei e ainda bem que não falei.

Naquele dia, o da notícia do novo hóspede, já encontrei as coisas dele no meu quarto, ou melhor, no de D. Celina. Se fosse meu, Lima não estaria lá. Ainda bem que era dela. Mas, como ele tava trabalhando, não o conheci de imediato. Fiquei imaginando a cara dele. Só via uma coisa muito feia. Ainda não sabia que era linda. À noite, como costumava fazer sempre depois da janta, fui pra janela do quarto pitar um cigarrinho. Defronte do prédio tinha uma barraquinha. Dessas que parecem banca de revista, mas, na verdade, é um bar. Tinha um coroa de cabelo relativamente comprido, encostado no balcão tomando uma cerveja. Não sei porque motivo mas aquela pessoa me chamou à atenção. Na mesma hora pensei: bem que meu novo colega de quarto poderia ser como aquele cara. Um sujeito que chega do trabalho, ao fim do dia, e passa na barraquinha pra tomar uma. Sangue bom esse cara. Foi simpatia instantânea. Só não falo amor à primeira vista porque seria muita viadagem e, nem eu nem Lima, somos chegados a tal. Mas fiquei com inveja por aquele não ser o meu colega de quarto. Eu não sabia, mas era ele. Ainda bem!

Lima passou por minha vida como um meteoro. Rápido demais, mas deixou marcas que uma existência inteira não pode apagar. Uma delas foi Elomar. Hoje, conversando com Lai, me acabei de chorar ouvindo “Seresta Sertaneza”, música que conheci muitos anos depois de Lima e cantada por um mineiro, Saulo Laranjeira, no disco Minas de Lua de 1985, mas que só conheci na década de 90. Tinha de ser mineiro! Lembro como se fosse hoje do dia que Lima me falou de Elomar. Falou como se falasse de alguém que eu conhecesse muito. Eu até já tinha visto o cara no MPB 80. Aquele festival da Globo. Lembram? Cantando “O Peão na Amarração”. Não entendi nada e não gostei. Como é que um menino de onze anos pode gostar de “O Peão na Amarração”? “...É a ceguera de dexá, Um dia de ser pião. De nun comprá nem vendê,. Robá isso tomém não De num sê mais impregado I tomém num sê patrão ...”. Como diria Juvenal, ou melhor Billy, ou melhor ainda, o Nego Preto, vá matar o cão! “O Peão na Amarração” é tudo de bom assim como Lima.

Sinto uma saudade danada deste cara. Gostaria muito de reencontrá-lo. Agora, botando fé nesta rede maluca e poderosa, quero crer que ele leia este texto e me mande um e-mail, me dê um alô. Obrigado Lima por ter invadido o meu espaço e me apresentado a Elomar. Você é foda! É dez!

P.S. Hoje eu disse a Lai: “no dia que eu escrever algo como “Seresta Sertaneza”, posso morrer em paz!

Um comentário:

Adriano Carôso disse...

O que seria das minhas crases se não fosse Luciano? Obrigado Lyce!