Segundo meu pai, o velho Carôso, foi a criança quem descobriu que o pé do Diabo era redondo. Realmente, criança faz coisa que Deus duvida. Minhas lembranças desta época são as melhores possíveis. Tive uma infância invejável. Muito diferente das de hoje, quando as crianças só brincam em vídeo games e ficam bitoladas na frente de um computador, quase sempre visitando conteúdos inadequados. Não sabem o prazer de sair fugido de casa e andar de bicicleta cinco quilômetros para tomar banho de rio, subir em árvores, fazer sua própria patinete, jogar bola no paralelepípedo tirando o gol toda vez que passava um carro, brincar de esconde-esconde, de baleado, de gude, de fura pé, enfim, de realmente ser criança. Eu tive o prazer de viver numa época onde a infância era coisa de criança e a criança era muito mais feliz.
É bem verdade que fui uma criança muito levada e, justamente por causa disto, vivia ficando de castigo e levando umas bordoadas da minha implacável mainha que me tirou da vagabundagem e me ensinou a ser homem. Bons tempos que não voltam mais, mas que não saem das lembranças. Como diria Ataulpho Alves, "eu era feliz e não sabia".
Lembro de Mundo Novo, interior da Bahia, quando com quatro anos entrei num tonel de lixo vazio para que os amigos empurrassem ladeira abaixo. Por causa disto ganhei o apelido de Sujismundo. Um personagem de uma campanha publicitária que pregava a higiene. Eu não tava nem aí. Na mesma cidade, tinha uma casa abandonada onde moravam duas famílias de mendigos. Fiz amizade com a criançada de lá e vivia enfurnado dentro daquela casa para desespero de minha mãe. Resultado, os piolhos criaram morada por longo tempo nos meus até então, acredite quem quiser, fartos cabelos louros e cacheados. Foi lá também, que entrei prematuramente para a escola, para os padrões da época é claro. Por causa do meu comportamento nada convencional, a professora do meu irmão Luciano, dois anos mais velho que eu, com pena da minha mãezinha sozinha para tomar conta de uma casa sem ajudante com um "pestinha daqueles", fez a proposta fatal: -Lourdinha, manda Adriano para a escola que lá a gente toma conta dele. Pelo menos num turno você fica mais descansada e pode dar conta do serviço da casa. A escola era na própria casa da professora. Lembro que no início eu ficava mesmo era brincando com a filha dela da mesma idade que eu. A menina era danada. A brincadeira que ela mais gostava de fazer era botar o dedo na xoxota e me dar pra chupar. Eu achava uma delícia! Depois resolvemos evoluir e ela botou um pedaço de bolacha cream craker, lambuzou bem e me deu pra comer. Resultado, a pró pegou a gente no flagra, pôs a menina de castigo e me botou dentro da sala de aula. Aí eu ganhei gosto pelos estudos, além do gosto por aquele sabor é claro, e em pouco tempo estava acompanhando a turma do meu irmão. No fim do ano, acho que pra se livrar de mim, disse a minha mãe que eu estava bastante desenvolvido e que deveria ingressar na primeira série em outra escola. Era verdade que eu já lia, escrevia e batia de frente com meus "colegas" de classe. Por causa disso, fiz o vestibular com dezesseis anos e ingressei na faculdade aos dezessete. Aos vinte já era professor do segundo grau.
Depois fomos morar em Juazeiro da Bahia nas margens do rio São Francisco. Eu adorava aquele lugar. Foi lá que vi Ivete Sangalo pela primeira vez. Ainda criança como eu. Meu pai era amigo de Seu Sangalo, pai de Ivete que morava em Petrolina mas tinha uma loja de variedades lá. Ele era parceiro de farras e tocatas do meu velho. Uma vez meu pai comprou um violão Gianninni na loja dele. Este violão eu sentei em cima e quebrei o seu braço muitos anos depois já em Santo Amaro da Purificação. Tomei uns tapas mas ficou por isso mesmo. Mas a lembrança mais marcante desta cidade foi quando, levantando um colega para tirar uvas na videira que tinha no quintal da minha casa, deixei o menino cair no chão. Ele quebrou a clavícula e eu fiquei com a bunda vermelha de tanta porrada.
Depois fomos pra Serrinha. Lá eu virei o Zorro tarado e o Espírito Assombrado. Calma, posso explicar. Vizinho a minha casa, tinha um colégio, o Comercial, existe até hoje, que tinha aulas à noite para uma turma de idade bem mais adiantada que a minha. Meninos de dezoito a vinte anos. Eu e minha galera, resolvemos fazer umas máscaras com papel duplex preto ao estilo da máscara do Zorro. Quando da saída da escola, ficávamos escondidos atrás de um caminhão que vivia estacionado na nossa rua e atacávamos as meninas quando elas passavam dando roubados beijos em suas boquinhas angelicais. Até o dia que eu ataquei a namorada do filho de um grande amigo de meu pai. Este me botou contra a parede e ameaçou contar tudo a meus pais. Claro que joguei a máscara fora e fui roubar pitos de pneus de carro. Era mais seguro. Até o dia que tomamos uma carreira do segurança do Banco do Brasil.
Naquela época, meus pais ficavam todos os dias jogando buraco com os amigos até de madrugada. Morávamos numa casa comprida, com um imenso corredor e seis quartos na parte interna da casa. Os quartos não tinham forro e, com o silêncio da madrugada, o som se propagava de forma amplificada. Certa feita, abri a gaveta da cômoda ao lado da minha cama para guardar um livro que estava lendo antes de dormir. Sem querer a fechei com muita força e esta fez uma zoada bem forte. Quando percebi o alvoroço lá dentro, fingi que estava dormindo e esperei para ver. Reparei que meus pais e seus amigos ficaram um longo tempo tentando entender o que aconteceu. Gostei daquilo e passei a fazer aquela zoada constantemente. Até um médium espírita, Seu Peixinho, meu pai levou lá em casa para descobrir o que era aquela "assombração". Depois de alguns meses, minha mãe desconfiou, me colocou contra a parede e eu acabei confessando. Mais um mês sem sair de casa.
De lá fomos para Santo Amaro, onde quebrei o violão comprado de Seu Sangalo, tomei banho na Pitinga que era um rio poluidíssimo onde a fábrica de papel jogava suas descargas, chupei minha primeira buceta, dei a minha primeira foda, aprendi a tocar violão mal e escrevi minha primeira letra de música valendo. Mas isto são outras histórias. "Eu era feliz e não sabia!".
Escrevi este texto atendendo ao pedido do querido amigo Leandro e à ele o dedico. Obrigado Leandro, você é uma pessoa muito especial. Indico este Meme para os amigos:
Vidal
Jacinta
Mary
Fernanda
Ana
Existem algumas regrinhas para este meme. Peço o favor que todos a sigam. São elas:
1. Colocar o(a) link de quem o convidou
2. Escrever um texto sobre lembranças da infância
3. Postar o selo do meme dentro do artigo
4. Se possível, colocar uma foto de quando era criança ou adolescente
5. Chamar cinco amigos para brincar com você.
Beijo a todos!
Eu e Luciano aos 05 e 07 anos respectivamente em Juazeiro-Ba
9 comentários:
É meu rei,
que bacana suas recordações. Legal quando a gente olha para o que fomos e vemos beleza no que nos torna o que somos.
quanto a mim, não sei se terei facilidade para falar. Vou tentar.
Beijos
Bela infância você teve, eu também tive uma infância bem agitada, veio a minha memória várias situações da minha infância enquanto eu lia a sua, o tempo bom!
Com certeza aceito o convite, não será uma história tão detalhada quanto a sua mais...
P.s: Espero mesmo que você não esqueça do meu jardim.*rs*
Beijos e flores!
Adrino,
entrando na sua brincadeira, coloquei no florescer um jeitinho diferente de falar de mim, quando criança. Não sou boa nisso não. Fotos eu não tenho, a chuva bebeu as poucas que tinha. O seu link já está no meu coração.
Beijos
E sua história de menino é porreta em garoto. Eita menino danado!
Adorei!!! De noite eu escrevo meu texto para postar!
Adoro essas lembranças que só fazem bem a nós, adultos de hoje.
Foi lá na infância que aprendemos a ser o que somos hoje.
Um super beijo, meu amigo.
:)
Adorei ler as tuas recordações de criança, seu assanhado!Lol
Agora já entendo porque gostas tanto de cozinhados...Lol
sabes "outra" coisa?Não me surpreendeu seres um menino tão inteligente.Se já te adorava imagina agora!És das pessoas mais simples que conheço e isso é simplesmente adorável!
Gosto de ti!Muito mesmo.
Beijokinhas
Gente, mas que infância e que adolescência, Adriano! Eu sempre me achei levada, mas admito que não cheguei aos seus pés... hahahaha! Você me lembrou o Zezé, de Meu Pé de Laranja Lima, seus cachinhos louros inclusive... Que gracinha!^^
Adoro posts de infância... =)
beijos!
Convite aceito e respondido.
Beijos e flores!
rapaaz,
post que me chamou a atenção por causa da temática. meus tempos de criança foram também de criança.
abraço, caroso.
hahahaha! Que post maravilhoso, meu amigo! Gostei muito, me diverti e viajei nas tuas travessuras de criança hahaha! Q legal q sempre foi pra frente e avançado hehehe!
Obrigado por este post, ele merece todos os prêmios tbm!
Abração!
Leandro
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