terça-feira, 25 de julho de 2023

MAIS UMA DE ROSALVO ABREU

Ilustrações e arte da capa: Caó Cruz Alves 



LEITOR NO PAPEL DE BARCOS NO CÉU

Depois de anos convivendo e trocando experiências poéticas com Rosalvo Abreu, achei que já conhecia bem o seu estilo de escrever. Porém, cometi a imprudência de julgar seu nove livro antes de ler uma página sequer. Quando ele me presenteou com um exemplar há dois dias, me avisou que os poemas não tinham título. Mais imprudente ainda fui aí, ao afirmar que, sem títulos, os poemas poderiam parecer “embaralhados” e de difícil assimilação. Mais uma vez na vida, tive um claro exemplo que, não devemos e não podemos falar do que não conhecemos. Confesso que saí daquele encontro, um tanto desanimado em ler o livro. Mas, Rosalvo é Rosalvo e, portanto, não pode ser ignorado. No dia seguinte já estava extremamente ansioso para entender como se escreve um livro de poesia em que os poemas não tenham título. Eu ia pegar a estrada hoje cedo, então preferi começar a ler em casa com mais calma. Qual não foi a minha surpresa. A falta de títulos que critiquei, é mais um elemento que torna o livro ainda mais espetacular, o que já acontece pela qualidade dos poemas que Rosalvo, de forma magistral, arrumou do início ao fim do livro. A simplicidade complexa da sua poesia, faz o leitor viajar em distintas interpretações. Provavelmente, embora distintas, todas corretas, e talvez nenhuma delas retrate a mensagem do autor. Mário Quintana já dizia: “Não há porque interpretar um poema, ele já é uma interpretação.” É nesse lema que o autor, nos leva a viagens imaginárias e reais, trilhando caminhos onde a paisagem é bela, palavra por palavra. 

A falta de títulos, deu ao livro uma dinâmica ímpar, uma beleza atemporal, e é mais um estímulo para o leitor mergulhar em cada um dos poemas nele presentes, deixando sua criatividade sem amarras, podendo então, dar asas à imaginação, tendo mais liberdade para sentir, que ele próprio, o leitor, é o autor de exímia obra de arte. O que me “assustou” de início e me tirou inicialmente a disposição para ler o livro, acabou por ser o que mais me encantou, e o que me fez voltar para primeira página, assim que acabei de ler a última. Ele consegue ser amargo em alguns versos, que acabam por cair na doçura e qualidade de tantos outros. Também me chamou a atenção, a grande quantidade de vezes que o autor usa a palavra “morte”. Impressionante é ver que, embora seja uma palavra “pesada”, ele consegue trazer tranquilidade com ela, sem, no entanto, trazer o desespero que ela sugere. Por vezes com o pesado sentido que ela sugere, outras com uma leveza que só a metáfora pode explicar. Rosalvo se supera a cada livro. Embora seja um poeta maduro, com um estilo marcante, é também capaz de usá-la de forma serena e bonita. 

A falta de títulos faz com que, em alguns momentos, ficamos por vezes na dúvida, se na próxima página, é um novo poema, ou continuação do anterior, já que, em alguns casos, o elo entre os dois é muito forte.

Enfim, com “Barcos ao Léu & Cais de Papel”, Rosalvo demonstra que, sua obra a cada dia mais se agiganta, tornando-se cada vez melhor. Essa dupla leitura de uma levada só, arrancou-me lágrimas de emoção e orgulho. Leia você também amigo. Não tenha medo. O título é apenas uma figura poética pois, o Cais é de alvenaria e o Barco um porto seguro.

 

Serrinha, 17 de julho de 2023, 01:27hs 

Adriano Carôso


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